domingo, 24 de julho de 2011


CARTA SOBRE A FELICIDADE
(Epicuro)

Que ninguém hesite em se dedicar à filosofia enquanto jovem, nem se canse de fazê-lo depois de velho, porque ninguém jamais é demasiado jovem ou demasiado velho para alcançar a saúde do espírito. Quem afirma que a hora de dedicar-se à filosofia ainda não chegou, ou que ela já passou, é como se dissesse que ainda não chegou ou que já passou a hora de ser feliz. Desse modo, a filosofia é útil tanto ao jovem quanto ao velho: para quem está envelhecendo sentir-se rejuvenescer através da grata recordação das coisas que já se foram, e para o jovem poder envelhecer sem sentir medo das coisas que estão por vir; é necessário, portanto, cuidar das coisas que trazem a felicidade, já que, estando esta presente, tudo temos, e, sem ela, tudo fazemos para alcançá-la.
Pratica e cultiva então aqueles ensinamentos que sempre te transmiti, na certeza de que eles constituem os elementos fundamentais para uma vida feliz.
Em primeiro lugar, considerando a divindade como um ente imortal e bem aventurado, como sugere a percepção comum de divindade, não atribuas a ela nada que seja incompatível com a sua imortalidade, nem inadequado à sua bem-aventurança; pensa a respeito dela tudo que for capaz de conservar-lhe felicidade e imortalidade.
Os deuses de fato existem e é evidente o conhecimento que temos deles; já a imagem que deles faz a maioria das pessoas, essa não existe: as pessoas não costumam preservar a noção a noção que têm dos deuses. Ímpio não é quem rejeita os deuses em que a maioria crê, mas sim quem atribui aos deuses os falsos juízos dessa maioria. Com efeito, os juízos do povo a respeito dos deuses não se baseiam em noções inatas, mas em opiniões falsas. Daí a crença de que eles causam os maiores malefícios aos maus e os maiores benefícios aos bons. Irmanados pelas suas próprias virtudes, eles só aceitam a convivência com os seus semelhantes e consideram estranho tudo que seja diferente deles.
Acostuma-se à ideia de que a morte para nós não é nada, visto que todo bem e todo mal residem nas sensações, e a morte é justamente a privação das sensações. A consciência de que a morte não significa nada para nós proporciona a fruição da vida efêmera, sem querer acrescentar-lhe tempo infinito e eliminando o desejo de imortalidade.
Não existe nada de terrível na vida para quem está perfeitamente convencido de que não há nada de terrível em deixar viver. É tolo portanto quem diz ter medo da morte, não porque a chegada desta lhe trará sofrimento, mas porque o aflige a própria espera: aquilo que não nos perturba quando presente não deveria afligir-nos enquanto está sendo esperado.
Então, o mais terrível de todos os males, a morte, não significa nada para nós, justamente porque, quando estamos vivos, é a morte que não está presente; ao contrário, quando a morte está presente, nós é que não estamos. A morte, portanto, não é nada, nem para os vivos nem para os mortos, já que para aqueles ela não existe, ao passo que estes não estão mais aqui. E, no momento, a maioria das pessoas a foge da morte como se fosse o maior dos males, ora a deseja como descanso dos males da vida.
O sábio, porém, nem desdenha viver, nem teme deixar de viver; para ele, viver não é um fardo e não-viver não é um mal.
Assim, como opta pela comida mais saborosa e não pela mais abundante, do mesmo modo ele colhe os doces frutos de um tempo bem vivido, ainda que breve.
Quem aconselha o jovem a viver bem e o velho a morrer bem não passa de um tolo, não só pelo que a vida tem de agradável para ambos, mas também porque se deve ter exatamente o mesmo cuidado em honestamente morrer. Mas pior ainda é aquele que diz: bom seria não ter nascido, mas uma vez nascido, transpor o mais depressa possível as portas do Hades.
Se ele diz isso com plena convicção, por que não se vai desta vida? Pois é livre para fazê-lo, se for esse realmente seu desejo; mas se o disse por brincadeira, foi um frívolo em falar de coisas que brincadeira não admitem.
Nunca devemos nos esquecer de que o futuro não é nem totalmente nosso, nem totalmente não-nosso, para não sermos obrigados a esperá-lo como se estivesse por vir com toda a certeza, nem nos desesperarmos como se não estivesse por vir jamais.
Consideremos também que, dentre os desejos, há os que são naturais e os que são inúteis; dentre os naturais, há uns que são necessários e outros, apenas naturais; dentre os necessários, há alguns que são fundamentais para a felicidade, outros, para o bem-estar corporal, outros, ainda, para a própria vida. E o conhecimento seguro dos desejos leva a direcionar toda escolha e toda recusa para a saúde do corpo e para a serenidade do espírito, visto que esta é a finalidade da vida feliz: em razão desse fim praticamos todas as nossas ações, para nos afastarmos da dor e do medo.
Uma vez que tenhamos atingido esse estado, toda a tempestade da alma se aplaca, e o ser vivo não tendo que ir em busca de algo que lhe falta, nem procurar outra coisa a não ser o bem da alma e do corpo, estará satisfeito. de fato, só sentimos necessidade do prazer quando sofremos pela sua ausência; ao contrário, quando não sofremos, essa necessidade não se faz sentir.
É por essa razão que afirmamos que o prazer é o início e o fim de uma vida feliz. com efeito, nós o identificamos como o bem primeiro e inerente ao ser humano, em razão dele praticamos toda escolha e toda recusa, e a ele chegamos escolhendo todo bem de acordo com a distinção entre prazer e dor.
Embora o prazer seja nosso bem primeiro e inato, nem por isso escolhemos qualquer prazer: há ocasiões em que evitamos muitos prazeres, quando deles nos advêm efeitos o mais das vezes desagradáveis; ao passo que consideramos muitos sofrimentos preferíveis aos prazeres, se um prazer maior advier depois de suportarmos essas dores por muito tempo. Portanto, todo prazer constitui um bem por sua própria natureza; não obstante isso, nem todos são escolhidos; do mesmo modo, toda dor é um mal, mas nem todas devem ser sempre evitadas. Convém, portanto, avaliar todos os prazeres e sofrimentos de acordo com o critério dos benefícios e dos danos. Há ocasiões em que utilizamos um bem como se fosse um mal e, ao contrário, um mal como se fosse um bem.
Consideramos ainda a auto-suficiência um grande bem; não que devamos nos satisfazer com pouco, mas para nos contentarmos esse pouco caso não tenhamos o muito, honestamente convencidos de que desfrutam melhor a abundância os que menos dependem dela; tudo o que é natural é fácil de conseguir; difícil é tudo o que é inútil.
Os alimentos mais simples proporcionam o mesmo prazer que as iguarias mais requintadas, desde que se remova a dor provocada pela falta: pão e água produzem o prazer mais profundo quando ingeridos por quem deles necessita.
Habituar-se às coisas simples, a um modo de vida não luxuoso, portanto, não é só conveniente para a saúde, como ainda proporciona ao homem os meios para enfrentar corajosamente as adversidades da vida: nos períodos em que conseguimos levar uma existência rica, predispõe o nosso ânimo para melhor aproveitá-la, e nos prepara para enfrentar sem temos as vicissitudes da sorte.
Quando então dizemos que o fim último é o prazer, não nos referimos aos prazeres dos intemperantes ou aos que consistem no gozo dos sentidos, como acreditam as pessoas que ignoram o nosso pensamento, ou não concordam com ele, ou o interpretam erroneamente, mas ao prazer que é a ausência de sofrimentos físicos e de perturbações da alma. Não são, pois, bebidas nem banquetes contínuos, nem a posse de mulheres e rapazes, nem o sabor dos peixes ou das outras iguarias de uma mesa farta que tornam doce uma vida, mas um exame cuidadoso que investigue as causas de toda escolha e de toda rejeição e que remova as opiniões falsas em virtude das quais uma imensa perturbação toma conta dos espíritos. De todas essas coisas, a prudência é o princípio e o supremo bem, razão pela qual ele é mais preciosa do que a própria filosofia; é dela que originaram todas as demais virtudes; é ela que nos ensina que não existe vida feliz sem prudência, beleza e justiça sem felicidade. Porque as virtudes estão intimamente ligadas à felicidade, e a felicidade é inseparável delas.
Na tua opinião, será que pode existir alguém mais feliz do que o sábio, que tem um juízo reverente acerca dos deuses, que se comporta de modo absolutamente indiferente perante a morte, que bem compreende a finalidade da natureza, que discerne que o bem supremo está nas coisas simples e fáceis de obter, e que o mal supremos ou dura pouco, ou só nos causa sofrimentos leves? Que nega o destino, apresentado por alguns como o senhor de tudo, já que as coisas acontecem ou por necessidade, ou por acaso, ou por vontade nossa; e que a necessidade é incoercível, o acaso instável, enquanto nossa vontade é livre, razão pela qual nos acompanham a censura e o louvor?
Mais vale aceitar o mito dos deuses, do que ser escravo do destino dos naturalistas; o mito pelo menos nos oferece a esperança do perdão dos deuses através das homenagens que lhes prestamos, ao passo que o destino é uma necessidade inexorável.
Entendendo que a sorte não é uma divindade, como a maioria das pessoas acredita (pois um deus não faz nada ao acaso), nem algo incerto, o sábio não crê que ela proporcione aos homens nenhum bem ou nenhum mal que sejam fundamentais para uma vida feliz, mas, sim, que dela pode surgir o início de grandes bens e de grandes males. A seu ver, é preferível ser desafortunado e sábio, a ser afortunado e tolo; na prática, é melhor que um bom projeto não chegue a bom termo, do que chegue a ter êxito um projeto mau.
Medita, pois, todas estas coisas e muitas outras a elas congêneres, dia e noite, contigo mesmo e com teus semelhantes, e nunca mais te sentirás perturbado, quer acordado, quer dormindo, mas viverás como um deus entre os homens. Porque não se assemelha absolutamente a um mortal o homem que vive entre bens imortais.
Epicuro *
Do livro: “Carta sobre Epicuro”, Editora Unesp, ed. bilíngue, grego/português, tradução de Álvaro Lorencini e Enzo Del Carratore, 1997, SP

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Física, Deus e Filosofia




A física é uma área competente e capacitada para a experiência em torno da existência de Deus?

O físico teórico Michio Kaku, considerado um dos cientistas mais importantes da atualidade, diz ter criado uma teoria que pode apontar a existência de Deus.

Kaku chegou à essa conclusão por meio de um estudo, ele usou um “semi-raio primitivo de táquions” (Táquions são partículas teóricas, capazes de “desgrudar” do Universo a matéria ou vácuo que entrar em contato com ela, assim, deixando qualquer coisa livre das influências do universo à sua volta), tecnologia criada recentemente em 2005.Embora a tecnologia para chegar às verdadeiras partículas de táquions ainda esteja muito longe de ser alcançada, o semi-raio tem algumas poucas propriedades dessas partículas teóricas, que são capazes de criar o efeito dos verdadeiros táquions, em escala subatômica.

Os resultados dessas experiências fizeram Michio concluir que a existência de “Deus” se deve ao fato de nós vivermos em uma “Matrix”.

“Cheguei à conclusão que estamos em um mundo feito por regras criadas por uma inteligência, não muito diferente do seu jogo preferido de computador, claro, impensavelmente mais complexa,” disse.

Ele analisou o comportamento da matéria em escala subatômica e percebeu que a parte afetada pelo semi-raio primitivo de táquions, um minúsculo ponto do espaço, estava totalmente livre de qualquer influência do universo, matéria, força ou lei.

“Acredite, tudo que nós chamávamos de casualidade até hoje, não fará mais sentido. Para mim está claro que estamos em um plano regido por regras criadas, e não moldadas pelo acaso universal”, comentou o cientista.

O comentário de Kaku criou alvoroço no meio científico, dado a sua importância no meio, em especial pela criação da Teoria das Cordas que o fez ser extremamente respeitado por outros cientistas.

A pertinência do Nome

(2Filosofia Clínica)

(2Filosofia Clinica)

Leia a matéria a seguir com Lúcio Packter, Qual a sua opinião
a respeito? Acha que o título da matéria corresponde ao que
o filósofo disse sobre o assunto?

Significados e Equivocidades

(1Filosofia Clínica)

Há muitas trocas de e-mails e mensagens na Internet.


Vamos supor que você é um professor de filosofia clínica, gaúcho e recebe de uma colega, especialista em Filosofia Clínica, um e-mail com o seguinte enunciado:
"Um engenheiro gaúcho teve a feliz ideia de mandar fazer desenhos no muro de uma ponte em Pelotas, no Rio Grande do Sul. Toda a população, principalmente a masculina, adora a sombra que o muro projeta. Já virou ponto turístico da cidade que os gaúchos vão visitar em romaria. Não se cansam de admirar a obra que vai ser tombada como patrimônio municipal."
Você entenderia isso como brincadeira, piada de gosto duvidoso, equivocidade ou outra coisa?


Resposta - A natureza da interseção entre as pessoas envolvidas deve ser pesquisada, além de outros fatores que podem ser importantes. Estes fatores vão dos dados de semiose ao significado e passam por diversas variáveis. Exemplo: a pessoa que enviou costuma enviar este tipo de e-mail? Pode ter sido um engano? A pessoa pretende lhe passar algum comentário via Vice Conceito? Qual o nível cultural e social desta pessoa? Esta pessoa, por Recíproca de Inversão, conhece o que e de que forma será tal e-mail recebido? Há termos equívocos. Enfim, estamos diante de uma série de elementos que pedem verificação antes de atendermos como entender tal mensagem.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

O VAZIO DA VIDA ACADÊMICA


O VAZIO DA VIDA ACADÊMICA.
(Ângelo Monteiro)


Certas posturas e inflexões, certa forma de dizer não dizendo, a constante cautela com qualquer ponto de vista que possa soar polêmico ou politicamente incorreto: tudo isso termina concorrendo para que os nossos mestres se tornem cada vez mais impermeáveis a todo tipo de ação criadora. Se jamais acreditei que a igreja, a Sinagoga e a Mesquita tenham mais do que dar às nossas almas que o próprio Deus, muito menos me julgo obrigado a crer que qualquer instituição universitária, por melhor que seja, venha a conceder mais ao estudioso do que o estudo nas próprias fontes. Por isso não consigo ver a Universidade como um ambiente sagrado – como até alguns jovens de sisuda inteligência o conseguem – em que a voz de como a de um papa ou de um profeta do Velho Testamento.

O que acontece, na maioria das vezes, é justamente o contrário: como quando eu próprio me vi submetido a um processo de avaliação docente, em que perdi pontos porque entreguei a meus examinadores um livro então publicado em lugar de um suposto material didático, (quando bastava, segundo eles, uma cópia em xerox do original), -como se um livro de Filosofia da arte não fosse um material didático – e porque não tinha participado, nos dois últimos anos, de nenhuma banca examinadora, como se isso dependesse de mim, e como se o ato de avaliar e ser avaliado fosse superior ao de pensar, ensinar, escrever e publicar livros...

Daí o vazio da chamada vida acadêmica, onde o que menos conta é o conhecimento em si mesmo, e onde o magistério detém menos importância do que a atividade administrativa; e o que mais sobra, além das discussões teóricas sobre gêneros e manifestações periféricas, e das reuniões intermináveis, é a luta por cargos e consultorias. Péssima como esposa ou como amante, protocolar e rígida, a Universidade hoje – sobretudo em termos de ciências humanas, dominadas por critérios unicamente ideológicos – só costuma despertar o entusiasmo de espíritos rotineiros e subalternos, ou de almas temerosas de comprometimento com qualquer coisa mais exigente, sobretudo com as coisas do espírito.

O ambiente universitário, por vezes, um espetáculo não muito sedutor para os inquietos de espírito quando, fechado num círculo de formas protocolares do dizer e do fazer de uma casta à parte, vê o mundo apenas através do disfarce das lunetas acadêmicas, concebendo o conhecimento mais como um meio de obter status que de alcançar o difícil troféu da sabedoria.


Desta só me resta hoje, além da ligação pessoal com algumas figuras independentes, a afável lembrança dos alunos que ainda me convidam, como recentemente, para paraninfo de suas turmas. Um sinal de que também, não foi má a lembrança que lhes deixei...
Fonte: Jornal Contraponto, 342-.
15 a 21 de julho de 2011