sábado, 3 de março de 2012

NIETZSCHE E A EDUCAÇÃO


Uma boa metáfora para o erudito é compará-lo ao verniz, pois este autonomiza o objeto em relação ao sujeito, algo que torna o conhecimento petrificado, numa prática contínua de deixar o passado, ou o conhecimento de outros povos, sempre válido para o presente; ou seja, a prática erudita tende a uma covardia e a uma preguiça que podem imobilizar o presente em nome de um passado incessantemente revisitado. O eruditismo, não respondendo adequadamente às questões da vida, cujo conhecimento é sempre contingente, torna-se o senhor do excesso e do supérfluo, pois a decompõe em prol de seus vários interesses unilaterais (especializados), preconizando o desprezo pela grandeza da existência, que exige uma visão orgânica e não uma restrição por parte do erudito. Segundo Nietzsche, o erudito "decompõe uma imagem em simples manchas, do mesmo modo como, na ópera, se usa um binóculo para ver a cena e examinar um rosto ou um detalhe da vestimenta, nada inteiro"




Como metáfora ao ensino restritivo, esse tipo de eruditismo acaba por sufocar a semente do impulso crítico, sentido oposto da verdadeira Educação, e contribui para o conformismo político

"SEGUNDO O PENSADOR NIETZSCHE,O CONHECIMENTO ACADÊMICO E ERUDITO "PURO" ABORTA O IMPULSO CRÍTICO E NÃO É SUFICIENTE PARA A VIDA EM SOCIEDADE."

Percebe-se uma clara crítica do alemão Friedrich Nietzsche, em alguns momentos , a disciplina Filosofia quando esta parece ter sido alçada em um pedestal, inalcançável até mesmo aos próprios e dedicados estudiosos.
Os problemas revelados pelo filósofo na Educação da Alemanha Oitocentista, em que talentos eram sufocados ou aqueles que já tinham prestígio escreviam de forma ininteligível para esconder a falta de ideias.
Diante disso, o conhecimento torna-se estanque, apenas teórico, inacessível à existência, um saber desvinculado da vida. Essa é a crítica de Nietzsche, fortemente influenciado por outro alemão, Arthur Schopenhauer. É um tipo de herança que ainda podemos encontrar nas Universidades e que pode frear o impulso crítico, contrário ao que uma Educação deveria promover.
O filósofo Friedrich Nietzsche (1844-1900), enquanto professor de Filologia Clássica da Universidade de Basileia (1869-1879), manifestava em suas atividades intelectuais um importante compromisso pedagógico de contribuir para o desenvolvimento saudável da Cultura alemã que, segundo sua perspectiva, se encontrava em uma marcha de decadência valorativa. Tal declínio ocorria, grandemente, devido à "cultura erudita", tendência intelectual caracterizada por valorizar apenas a razão em detrimento do instinto. Esse problema se inscreverá em algo muito caro a Nietzsche: a oposição entre Arte (vida, instinto) e razão. Quando a vida - que é um poder "obscuro, insaciavelmente sedento de si mesmo" - é subjugada, e quando a racionalidade é posta no pedestal, é porque a barbárie está à porta.
Diante disso, é possível perceber que quando Nietzsche desenvolve suas críticas ao problema do eruditismo, por conseguinte, a própria Cultura moderna e de que forma esta constrói seu ideal de ser humano: tal problema torna-se uma "lente de contato" para que o filósofo analise a espinhosa e "tão urgente" temática da formação do humano. Viver adequadamente o presente, criar valores, utilizar-se do conhecimento em prol da vida: nesses aspectos se sintetiza o combate de Nietzsche contra a razão a todo custo incentivada pela modernidade
Em sua III Consideração Intempestiva - Schopenhauer como educador, Nietzsche compreende treze características que norteiam a tipologia do erudito, sendo possível sintetizá-las desta maneira: "(...) o erudito consiste numa rede misturada de impulsos e excitações muito variadas, é um material impuro por excelência"1.

Não se deve pressupor, obviamente, que o conhecimento seja algo prejudicial para a vida e que a erudição seja sinônimo de prejuízo (e filisteísmo) para o ser humano.
O que está em questão é o excesso, que pode tornar o conhecimento uma desvantagem para a existência. É necessário esclarecer que o homem erudito não é necessariamente um filisteu, pois este prospera financeiramente mediante a especulação da Cultura enquanto que o erudito, em essência, cria um tipo de saber que fica preso a uma falta de experiência com a imanência da vida.
É neste contexto que as críticas de Arthur Schopenhauer (1788-1860) a Hegel (1770-1831) - e sua respectiva in¬fluência sobre o desenvolvimento da Filosofia, a acadêmica alemã do Oitocentismo - ecoaram de modo excepcional em Nietzsche.
É necessário destacar que Schopenhauer considera que, mediante a influência de Hegel, a Filosofia universitária (acadêmica) torna-se a Filosofia por excelência, enquanto que a Filosofia que não se enquadrasse nesse modelo, tornava- -se intelectualmente e valorativamente excluída.

Percebe-se uma clara crítica do alemão Friedrich Nietzsche, em alguns momentos , a disciplina Filosofia quando esta parece ter sido alçada em um pedestal, inalcançável até mesmo aos próprios e dedicados estudiosos.
Os problemas revelados pelo filósofo na Educação da Alemanha Oitocentista, em que talentos eram sufocados ou aqueles que já tinham prestígio escreviam de forma ininteligível para esconder a falta de ideias.
Diante disso, o conhecimento torna-se estanque, apenas teórico, inacessível à existência, um saber desvinculado da vida. Essa é a crítica de Nietzsche, fortemente influenciado por outro alemão, Arthur Schopenhauer. É um tipo de herança que ainda podemos encontrar nas Universidades e que pode frear o impulso crítico, contrário ao que uma Educação deveria promover.
O filósofo Friedrich Nietzsche (1844-1900), enquanto professor de Filologia Clássica da Universidade de Basileia (1869-1879), manifestava em suas atividades intelectuais um importante compromisso pedagógico de contribuir para o desenvolvimento saudável da Cultura alemã que, segundo sua perspectiva, se encontrava em uma marcha de decadência valorativa. Tal declínio ocorria, grandemente, devido à "cultura erudita", tendência intelectual caracterizada por valorizar apenas a razão em detrimento do instinto. Esse problema se inscreverá em algo muito caro a Nietzsche: a oposição entre Arte (vida, instinto) e razão. Quando a vida - que é um poder "obscuro, insaciavelmente sedento de si mesmo" - é subjugada, e quando a racionalidade é posta no pedestal, é porque a barbárie está à porta.


Diante disso, é possível perceber que quando Nietzsche desenvolve suas críticas ao problema do eruditismo, por conseguinte, a própria Cultura moderna e de que forma esta constrói seu ideal de ser humano: tal problema torna-se uma "lente de contato" para que o filósofo analise a espinhosa e "tão urgente" temática da formação do humano. Viver adequadamente o presente, criar valores, utilizar-se do conhecimento em prol da vida: nesses aspectos se sintetiza o combate de Nietzsche contra a razão a todo custo incentivada pela modernidade.
Em sua III Consideração Intempestiva - Schopenhauer como educador Nietzsche compreende treze características que norteiam a tipologia do erudito, sendo possível sintetizá-las desta maneira: "(...) o erudito consiste numa rede misturada de impulsos e excitações muito variadas, é um material impuro por excelência"1.

Uma boa metáfora para o erudito é compará-lo ao verniz, pois este autonomiza o objeto em relação ao sujeito, algo que torna o conhecimento petrificado, numa prática contínua de deixar o passado, ou o conhecimento de outros povos, sempre válido para o presente; ou seja, a prática erudita tende a uma covardia e a uma preguiça que podem imobilizar o presente em nome de um passado incessantemente revisitado. O eruditismo, não respondendo adequadamente às questões da vida, cujo conhecimento é sempre contingente, torna-se o senhor do excesso e do supérfluo, pois a decompõe em prol de seus vários interesses unilaterais (especializados), preconizando o desprezo pela grandeza da existência, que exige uma visão orgânica e não uma restrição por parte do erudito. Segundo Nietzsche, o erudito "decompõe uma imagem em simples manchas, do mesmo modo como, na ópera, se usa um binóculo para ver a cena e examinar um rosto ou um detalhe da vestimenta, nada inteiro"


O problema do conhecimento (in)útil
Nietzsche critica o eruditismo exagerado que, segundo o filósofo, pode ser uma desvantagem para a existência, pois é um saber desvinculado da vida

Não se deve pressupor, obviamente, que o conhecimento seja algo prejudicial para a vida e que a erudição seja sinônimo de prejuízo (e filisteísmo) para o ser humano.
O que está em questão é o excesso, que pode tornar o conhecimento uma desvantagem para a existência. É necessário esclarecer que o homem erudito não é necessariamente um filisteu, pois este prospera financeiramente mediante a especulação da Cultura enquanto que o erudito, em essência, cria um tipo de saber que fica preso a uma falta de experiência com a imanência da vida.
É neste contexto que as críticas de Arthur Schopenhauer (1788-1860) a Hegel (1770-1831) - e sua respectiva in¬fluência sobre o desenvolvimento da Filosofia, a acadêmica alemã do Oitocentismo - ecoaram de modo excepcional em Nietzsche.
É necessário destacar que Schopenhauer considera que, mediante a influência de Hegel, a Filosofia universitária (acadêmica) torna-se a Filosofia por excelência, enquanto que a Filosofia que não se enquadrasse nesse modelo, tornava- -se intelectualmente e valorativamente excluída.
Para Schopenhauer, quando Hegel, Fichte e Schelling (expoentes do Idealismo alemão) conseguiram grande inserção nos meios culturais alemães, estruturaram um estilo de escrita truncado, pautado na obscuridade, e isso porque "para ocultar a falta de pensamentos verdadeiros, muitos constroem um imponente aparato de longas palavras compostas, intricadas ¬ ores de retórica, períodos a perder de vista, expressões novas que, no conjunto, resultam num jargão que soa o mais erudito possível".
Schopenhauer critica a noção de que quanto maior a dificuldade de se interpretar o sentido fundamental de um texto, maior seria a "aura" de genialidade de seu autor, pois, em razão disso, o leitor, no seu íntimo, poderia vir a acreditar que, caso não fosse capaz de compreender as teses desenvolvidas nestas obras estilisticamente obscuras, ele próprio deveria se auto responsabilizar por essa deficiência intelectual, sob a pena de ser marginalizado.

Nessa esteira acontece uma surpreendente inversão de valores: o filósofo que não faz parte do ambiente universitário e da sua burocracia (trâmites institucionais) torna-se apenas um "livre-pensador", desvinculado da "autêntica Filosofia". Contudo, a atividade elementar do filósofo acadêmico, segundo Schopenhauer, seria a de legitimar, por meio de sua produção intelectual, a estrutura sociopolítica vigente, submetendo a atitude filosófica aos interesses obtusos do Estado.
Nietzsche compartilha esta ideia, ao afirmar que: "O Estado jamais se importa com a verdade, salvo com aquela que lhe é útil - mais exatamente, ele se ocupa em geral com tudo o que lhe é útil, seja isso verdade, meia-verdade ou erro".
Schopenhauer, por sua vez, faz valer a tese de que a sabedoria é essencialmente atemporal e apolítica, ainda que trate de questões políticas e do tempo presente que estão fundamentalmente relacionadas ao desenvolvimento humano.
A crítica de Schopenhauer ao projeto civilizatório e moralista do Estado, à Filosofia universitária e ao projeto de ensino universitário de Filosofia - que se baseava, sobretudo, na interpretação historiográfica dos conceitos do filósofo analisado, enquanto que sua proposta seria a de um ensino com caráter propedêutico, que tomasse sistemas de Filosofia a partir de uma seleção de textos reunidos em vista do que já se pensou originalmente, e na qual o próprio estudante deveria esforçar-se para compreender o sistema de pensamento desse filósofo, trilhando seu próprio caminho -, demonstra o caráter extemporâneo do filósofo. Na direção deste, Nietzsche diz que a Filosofia excluída da universidade que, com isso, readquire autonomia, poderia se estruturar em um tribunal superior da Cultura, que faz tanta falta a uma sociedade: "(...) é uma necessidade de a Cultura privar a Filosofia de qualquer reconhecimento do Estado e da Universidade”.
DEFESA DO AUTÊNTICO
Nietzsche, em sua defesa do autêntico ideal Filosófico, demonstra a sua filiação ao projeto intelectual de Schopenhauer, considerando-o seu "educador", pelo fato de ter se colocado contra os valores de sua época, não admitindo que os objetivos essenciais da Cultura fossem determinados por valores contrários a ela, sejam os interesses utilitários do mercado ou os do Estado e a de "confundir" a formação do filósofo com a do "homem da Ciência" e a do "operário da Filosofia". Nessas condições, a imagem de Schopenhauer se estrutura como modelo de educador que luta contra as limitações que sua época colocava ao genuíno ideal filosófico, à "verdadeira" Filosofia. “Enquanto continue a existir este pseudo-pensamento reconhecido pelo Estado, a ação grandiosa de uma verdadeira Filosofia será malograda”...
Há uma necessidade de a Cultura privar a Filosofia de qualquer reconhecimento do Estado e da Universidade e dispensar absolutamente o Estado e a Universidade da tarefa insolúvel para ambos de distinguir entre a verdadeira Filosofia e a Filosofia aparente"

Para Nietzsche, Schopenhauer seria o modelo de educador, já que a função deste é instituir novamente o valor da existência e "elevar alguém acima da insuficiência da atualidade e de ensinar novamente a ser simples e honesto no pensamento e na vida". Com Schopenhauer, Nietzsche pôde compreender-se melhor em relação a si mesmo e é esse o sentido de sua gratidão. O gênio, de acordo com Nietzsche, utilizaria o conhecimento advindo da sua formação para cultivar os valores da vida, subjugando, por consequência, os saberes desvinculados desta.
HOMEM TEÓRICO
A relação entre saber desvinculado da vida, por sua vez, é semelhante ao que aconteceu a Nietzsche quando, durante seus três primeiros anos no internato de Pforta, estudou sem descanso, chegando depois à reflexão: "o que havia lucrado com ela?", e à sua crítica ao sistema educacional que se deparou enquanto professor, que visava promover o "homem teórico", que separava a vida do pensamento: "Nietzsche sonha com um ideal de Educação que o estudo dos gregos pré-platônicos lhe revelara, uma Educação ancorada nas experiências da vida de cada indivíduo". Dessa maneira, Nietzsche não despreza o indivíduo que valoriza o conhecimento, mas critica de forma intempestiva o ideário de educador da Alemanha do século XIX, cujo protótipo era de um sujeito (erudito) que conhecia demais o passado e, em decorrência negativa disso, acabava por não viver adequadamente o presente, não criando novos valores.
Com efeito, a Educação formal, ministrada nas instituições de ensino da Alemanha Oitocentista, muitas vezes motivava o aniquilamento simbólico dos tipos geniais, pois a estrutura pedagógica dessas instituições de ensino não se encontrava preparada para receber adequadamente as exceções - as figuras singulares -, estabelecendo um parâmetro de Educação padronizado, massificado, envelhecido. Nietzsche esclarece essa característica sobre a singularidade ao fazer analogia às espécies do reino animal e vegetal, onde apenas o "exemplar individual superior" lhes importa e não aquele que se encontra nivelado em erros ou em preconceitos enraizados pela Educação: "A humanidade deve constantemente trabalhar para engendrar grandes homens - eis aí a sua tarefa, e nenhuma outra. Como gostaríamos de aplicar à sociedade e a seus fins um ensinamento que pudesse ser extraído da consideração de todas as espécies do reino animal e vegetal - para elas, somente o exemplar superior, o mais incomum, o mais poderoso, o mais complexo, o mais fecundo -, que prazer não haveria aí se os preconceitos enraizados pela Educação quanto à finalidade da sociedade não oferecessem uma pertinaz resistência!"
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NIETZSCHE NÃO DESPREZA QUEM VALORIZA O CONHECIMENTO, MAS CRITICA O ERUDITO, QUE CONHECIA DEMAIS O PASSADO E ACABAVA POR NÃO VIVER O PRESENTE
O "abortamento do impulso crítico" - que visa suprimir a singularidade do indivíduo - constitui, para Nietzsche, justamente o oposto do sentido da verdadeira Educação: a frágil semente, que servia de metáfora para o processo formativo, acaba sendo sufocada por entulhos desprovidos de organicidade e esse é justamente o melhor caminho para o conformismo político. "E agora, que se imagine uma mente juvenil, sem muita experiência de vida, em que são encerrados confusamente cinquenta sistemas - que desordem, que barbárie, que escárnio quando se trata da Educação para a Filosofia!. De fato, todos concordam em dizer que não se é preparado para a Filosofia, mas somente para uma prova de Filosofia, cujo resultado, já se sabe, é normalmente que aquele que sai desta prova - eis que é mesmo uma provação - confessa para si com um profundo suspiro de alívio: Graças a Deus, não sou um filósofo, mas um cristão e um cidadão do meu país!"
É necessário, por fim, destacar que "formar" não é "informar" e entre os dois conceitos há uma grande diferença de valores. O ato de "informar" não é "formar" intelectualmente (culturalmente) um indivíduo. O ato de "formar" está relacionado à transmissão de conteúdos pedagógicos que proporcionam o desenvolvimento intelectual do indivíduo, possibilitando- -lhe adquirir uma consciência crítica em relação ao contexto social no qual ele está inserido, favorecendo assim a sua inserção na vida prática de transformação e esforço por mudanças na realidade circundante. "Informar", no âmbito da ação pedagógica, consiste no ato de se transmitir conteúdos didáticos, sem que neles necessariamente exista uma efetiva relevância orgânica para o estudante, que recebe continuamente uma grande quantidade de conteúdos que se tornam meros meios para a realização de fins (a aprovação no vestibular, por exemplo). A "informação" desprovida de reflexão motiva a passividade do estudante, que cria uma espécie de dependência simbólica em face do sistema pedagógico que lhe transmite tais informações. Para Nietzsche, a Educação deve engendrar a vida, pois, do contrário, torna-se mera mantenedora do status quo, cujo resultado é a acriticidade.
FONTE: REVISTA FILOSOFIA – 67

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