sexta-feira, 26 de abril de 2013

A Palavra (Pressupostos sobre o significado)


         PRESSUPOSTOS SOBRE O SIGNIFICADO
(A Palavra)
 
A filosofia da linguagem não se ocupa especificamente do que significam palavras, enunciados ou frase individuais, qualquer dicionário, enciclopédia ou busca no site do Google podem resolver o problema do significado das palavras. O que parece que os filósofos da linguagem buscam é “O que significa para uma frase ou frase significa alguma coisa?”; “Por que as expressões têm os significados que têm?”; “Como uma expressão pode ter o mesmo significado de outra?”. E, principalmente: “Qual o significado de “significado”?
A filosofia como paixão pelo saber, mais do que uma disciplina, torna-se um eterno questionar do homem sobre si mesmo. Nesse aspecto, não são de surpreender reflexões que versem, principalmente, sobre a linguagem; como as linguagens se relacionam com a realidade, a natureza do significado, como a comunicação é possível, o que é a verdade, o que é a necessidade lógica e como a linguagem se relaciona com a mente.
 
Será trabalhado neste ensaio este problema central da filosofia da linguagem, uma tentativa de compreender o que é para palavras e expressões tornarem-se portadores de “Significados”, ou seja, discussão sobre as possibilidades da linguagem em dizer ou não algo do mundo.
O humano para lidar com o mundo físico, que lhe é inacessível em muitos aspectos, criou dois tipos de mediadores: os instrumentos, que potencializam a ação humana diante do meio em que vive, e os símbolos, que são também instrumentos para o humano, pois potencializam a função mental. Dessa maneira, através de símbolos ou signos, o humano consegue colocar um estádio de futebol na cabeça. Os símbolos agem por representação, ou seja, trocam uma coisa por outra; trocam um objeto físico por um objeto mental. Para se referir ao estádio de futebol, usamos o símbolo correspondente que pode tanto ser uma palavra, um texto ou uma figura. Para cada situação diferente no mundo, usamos uma simbologia diferente. Uma cruz simboliza religião, uma suástica simboliza o nazismo, quatro círculos supostos simbolizam o Audi, etc.
Há grandes vantagens nessa abordagem com o mundo físico. Potencializamos, por exemplo, a memória, não é preciso lembrar-se de tudo, podendo anotar tarefas numa agenda ou deixar nossos pensamentos guardados num livro.
 Também podemos lidar com coisas que não existem imediatamente na nossa frente como se lidássemos com o inexistente. Sem as palavras só conseguiríamos nos comunicar apontando o dedo para as coisas que estão em nossa frente. Como poderíamos nos comunicar se tivéssemos que apontar com o dedo para o que queremos falar? “A frase: Vou para a biblioteca da UFPB” seria uma tarefa impossível. Seria necessário apontar o dedo para o prédio da Biblioteca que deveria estar necessariamente presente em nossa frente. Daí as vantagens de usarmos símbolos no lugar de coisas grandes e pesadas do mundo físico ou diálogos com ensinamentos filosóficos, a exemplo da história grega em que  apesar de Sócrates  nunca tivesse escrito nada –Platão que escreveu, elogiou Sócrates por isso.  A conversa e a linguagem falada seriam, depois, eternizadas nos Diálogos Platônicos, e prova que  estas seriam ótimos modos  de nos comportamos no exercício intelectual. Os filósofos, especialmente os especialistas na Filosofia da Linguagem, se perguntam qual  a capacidade de dizer o que é dito; “o problema do significado” da filosofia da linguagem, nomeadamente compreender o que é para palavras e expressões, tornarem-se portadores de “significados” – ou seja, discussão sobre as possibilidades da linguagem em dizer ou não algo do mundo.
Gottlob Frege (1848-1925) desenvolveu questões que envolviam matemática e aritmética ou, talvez, filosofia da matemática. Todavia, suas investigações adentraram para o campo semântico de uma maneira abrangente e, ao serem criticadas por Bertrand Russell (1872-1970) e, depois, aproveitadas e criticadas novamente por Wittgenstein, preencheram os capítulos básicos da filosofia analítica. O caminho destas investigações, fez com que a lógica de Frege, parecesse que se desenvolvia sem que ele tivesse uma intencional preocupação –ao menos inicialmente – com problemas filosóficos em um sentido amplo. A maneira de retomar a tradicional discussão metafísica a respeito do que é – iniciou filosoficamente os estudos semânticos; para muitos, Frege foi para a Filosofia analítica, o fundador dessa corrente.
As questões sobre “o significado”, diziam os estudos de Frege, são questões sobre a lógica ou que podem ser solucionadas a partir da lógica. Os argumentos filosóficos sobre qualquer assunto (da teoria do conhecimento à metafísica, passeando pela ética, educação, política e estética) seriam satisfatórios na exata medida da qualidade  de suas estruturas lógicas. De uma maneira que ampliando os princípios básicos da lógica seria possível obter noções fundamentais da aritmética- ou seja, a solidez da aritmética seria testada e aprovada a partir de considerações puramente lógica. Assim, por exemplo, a definição de número nada mais seria que uma derivação do princípio de identidade da lógica; isto é, a=a. Toda a  
aritmética poderia ser ‘reduzida’ à lógica. A Teoria do Significado baseado na referência ou a teoria referencial do Significado tem problemas. O que Frege identifica diz respeito ao valor cognitivo dos enunciados, ou das expressões, essa questão do valor cognitivo das expressões pode se resumir nos exemplos que Frege citou e que a teoria referencial do significado não dá conta.
Se tivermos a expressão “o pico do Jabre é o pico do Jabre” temos uma tautologia, ou uma identidade, o valor cognitivo dessa expressão é zero, ela não informa nada, ela não propicia nenhuma cognição, mas a expressão “o pico do Jabre é o lugar mais alto da Paraíba”, resulta em um valor cognitivo, bem delineado, determinado, nesta expressão há a informação geográfica, há um valor cognitivo, fica-se informado de alguma coisa. Mesmo que no primeiro enunciado tenhamos o mesmo significado do primeiro, pela Teoria Referencial- a referência continua sendo o pico do Jabre, ou seja, a referência ao falarmos do pico do Jabre remete ao ponto mais alto da Paraíba, mas o ponto mais alto da Paraíba é o pico do Jabre. Então, em termos de referência, em termos de significação, não saímos do mesmo campo. O que ocorre é que temos frases com valores cognitivos completamente diferentes e a mesma referência. Ora, como isso é possível? Como podemos dizer que é a mesma coisa? A resposta é que a teoria referencial não descreve bem a atividade que significa expressões, não descreve, eficazmente, a atividade para significar expressões. Então qual seria a solução que Frege propõe? Ele propõe uma solução que não é um conserto da teoria do significado, e sim, conduz a teoria do significado para outro campo; ele “reinventa“ uma teoria do significado.
O importante, é que, independentemente da validade de tais conclusões, o que Frege forneceu para a filosofia, foi o impulso de se desvencilhar do que, naquela época, diversos filósofos vinham chamando de psicologismo. Uma teoria do significado livre de psicologismo deveria mostrar o entendimento do significado de uma palavra sem lançar mão de eventos mentais que dela resultassem.    O que temos que observar é que enunciados, expressões, frases, proposições não podem ser tratadas como palavras, nos ensina Frege, em sua teoria, é como se estivesse dizendo: “vã até o sentido e terás o modo da apresentação – e a partir deste sentido determinarás a referência.” Então quando dissemos “O pico do Jabre é o ponto mais alto da Paraíba (1100 metros acima do nível do mar), tem-se que atentar para este modo de apresentação, o Pico do Jabre está sendo apresentado como o local geográfico que é o mais alto do Estado da Paraíba e este enunciado oferece o campo semântico, ou seja, o sentido que desvenda “aquilo” que ficamos sabendo o que é o significado deste enunciado, então é que a partir dai pode-se determinar as referências. Portanto, o Significado seria determinado pelo papel que a palavra desempenha no estabelecimento das condições de verdade de sentenças em que aparece. “Como exemplo, as “seguintes frases: “A Terra é quadrada”;” O Time da UFPB jogou basquete com uma bola quadrada”; ora, percebam que Frege não estava interessado nas imagens que tais enunciados poderiam evocar à mente de alguém. E sim, interessado nas condições que teriam de existir para se estabelecer a verdade ou a falsidade de tais sentenças.
A “Virada Linguística” encaminha a filosofia para uma atenção com o “Significado”; aprendemos que os positivistas lógicos dão a tarefa para a filosofia, como a busca para o significado, enquanto a questão da “verdade” eles deixam para a ciência. Este paradigma, ou esta ideia de que a filosofia é uma atividade que tem a ver com a busca do significado e não com a verdade, não é aleatória, se os positivistas lógicos assim agem e deixam a herança para todo o século XX e agora para XXI, com esta “Virada Linguística” com a atenção para o “Significado” é porque existe uma preocupação com algumas questões, principalmente com aquelas dúvidas que surgem a respeito da linguagem e em especial de “como é que a linguagem funciona?”.
A busca do significado pelos positivistas lógicos vai desembocar na ideia que para encontrarmos o significado temos que trabalhar com um elemento que é o verificacionismo como uma base e justificação. Que o significado é encontrado a partir da possibilidade que temos de descrevermos o método de verificação de um enunciado. Ou seja, se conseguirmos fazer uma boa descrição do caminho para dizer se o enunciado é verdadeiro ou falso – teremos a compreensão do enunciado; por exemplo, “Este notebook, no qual estou digitando este ensaio, está em cima  da mesa”, neste enunciado, como pode-se afirmar se é verdadeiro ou falso? O valor de verdade desta expressão como descobrimos?  Sabe-se que há um método simples – quando chegar até a mesa e olhar e constatar se o notebook está ou não. Se estiver, o enunciado é verdadeiro. Pelo contrário, se o notebook não estiver em cima da mesa, o enunciado é falso. Portanto, caso esse enunciado pode ser descrito ele tem significado, o essencial é saber descrever esse enunciado para encontrar a verdade dele para se conhecer o significado. Entretanto, o que os positivistas lógicos, afirmam como o filósofo Frege ou o que os outros antes disseram, é que a Teoria Referencial do Significado, apesar de popular, está no âmbito do senso comum, ela não descreve a maneira como de fato podemos entender a busca do significado. A Teoria Referencial do Significado é uma teoria que subsumi ou colocam em concordância, os enunciados, as frases ou as expressões. Quando falamos em palavra a tendência nossa - do nosso senso comum é buscar a referência da palavra para dizer que ela significa aquela referência. Por exemplo, quando dizemos a palavra “Paraíba”, a referência é “Paraíba” e imaginamos que o significado da Paraíba é a referência “Paraíba”. Ao contrário, não podemos fazer isso com os enunciados.
Para Ludwig Wittgenstein (1889-1951), “a questão o que é realmente uma palavra?” é análoga a o que é uma figura de xadrez?”¹. Isto porque a palavra é elemento dos jogos de linguagem. Estes jogos são objeto de comparação, clareando as relações existentes entre palavra e significado. Esses jogos de linguagem nos permitem uma articulação intermediária de significados, pois não “temos uma visão panorâmica do uso de nossas palavras” 2,  “nossa visão panorâmica é “nossa forma de representação, o modo pelo qual vemos as coisas”3.
Usamos as palavras como forma de representação, sendo que o mais importante na palavra não é a própria palavra, mas a significação, que é social. A “palavra significa a explicação que dermos à sua significação”4, ou seja, é a explicação do uso que fazemos de tal palavra nesse jogo de linguagem que realizamos no próprio convívio social.
Uma mesma palavra pronunciada ou escrita pode ter vários significados, por exemplo: manga. O que disse? Manga. Sem um contexto ou sem uma explicação do uso que faço da palavra manga, meu interlocutor pode não compreender a que me refiro: manga de camisa? Fruta? Esse uso da palavra manga deve ser explicitado no contexto de seu uso ou na explicação de seu uso. Portanto, não é a palavra em si mesma o que é mais importante, mas a significação social e explicada do uso que dela fazemos.
Bertrand Russell (1872- 1970), juntamente com Wittgenstein, foi responsável pelo retorno do atomismo em sua versão puramente filosófica e lógica. Após vários séculos de filosofia – depois da reviravolta da subjetividade implantada por Kant (de certa forma já prenunciada pelos gregos), quando se mostra fundamental, antes de se perguntar pelo mundo em si, perguntar pelas condições de possibilidade do homem de conhecer o mundo e depois da reviravolta lógica iniciada por Frege – as questões filosóficas deslocou seu centro de estudo da realidade para o estudo das condições do homem de conhecer a qualidade terminando por chegar à capacidade da linguagem de representar a realidade. Não se podia mais, portanto, pretender falar diretamente sobre o mundo sem antes se perguntar pela nossa capacidade de acessar o mundo, e sem se perguntar pela capacidade da linguagem em falar sobre esse mundo. Os atomistas lógicos pretendiam falar sobre o mundo, mas conscientes de que esse mundo era mediado linguisticamente. Eles partiram então, do pressuposto que a linguagem era capaz de representar o mundo, ou seja, que aquilo que dizemos corresponderia a algo que existiria na realidade. Ou melhor, que aquilo que dizemos poderia corresponder a uma realidade existente.
A pergunta então seria: como a linguagem consegue representar o mundo? Como aquilo que eu digo pode corresponder a um fato do mundo? Partindo, portanto, da linguagem, eles se questionaram: não há dúvidas de que falamos sobre o mundo, que quando eu digo algo como ‘minha cadeira é vermelha’, todo mundo que fala português entende perfeitamente o que estou dizendo, e isso se refere a um fato real, ou seja, minha cadeira realmente é vermelha.
Eles observaram que uma proposição como esta não era algo logicamente simples. Quando digo que ‘minha cadeira é vermelha’, digo também que ela tem uma cor, que ela tem um dono, que ela é um objeto que tem assento, encosto, pernas, etc. Todas estas são deduções lógicas, não é preciso ir até a cadeira para observá-la, simplesmente se deduz. Dizer que ‘minha cadeira é vermelha’ é, pois, dizer tudo isso ao mesmo tempo. Eles notaram que essa análise, essa decomposição que podemos fazer com quaisquer proposições com sentido de nossa linguagem, não pode prosseguir indefinidamente. Não podem essas proposições ser infinitamente complexas porque elas se referem a fatos do mundo que não são infinitamente complexos. O final dessa análise, portanto, devia esbarrar em pontos fixos, nomes que não mais poderiam ser decompostos. E esses nomes corresponderiam a objetos indecomponíveis do mundo. E o principal problema com o atomismo lógico dizia respeito à inadequação do modo como esses filósofos defendiam que linguagem representava o mundo. Seus questionamentos partiam da necessidade de uma isomorfia entre linguagem e mundo e não de um questionamento sobre o mundo em si.
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1 WITTGENSTEIN, Investigações filosóficas. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p.53.
2 Idem, p.56.
3 Idem, p.56.
4 MORENO, Arley R. Wittgenstein: os labirintos da linguagem: ensaio introdutório. São Paulo: Moderna, 2000, p.55.
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A Filosofia é uma atividade permanente de esclarecimento, não se pode reduzi-la a linguagem, como pretendeu a filosofia analítica. O esclarecimento permanente das questões tal como se apresentam concretamente na vida humana e não somente na linguagem, é óbvio que a análise da linguagem faz sua parte importante, como instrumento auxiliar, coisa que não pode ser exagerada, porque a maior parte dos elementos que lidamos ainda não tem uma formulação linguística de concordância unanime entre os filósofos, há elementos de experiência  interior e exterior que escapa da expressão linguística, um exemplo é o fenômeno das duas grandes guerras mundiais e das tiranias totalitárias, impondo aos seres humanos, uma quantidade de sofrimento e de situações absurdas que surgiram, as quais elas não conseguiram expressar verbalmente. Não esqueçamos que a própria lógica como disciplina científica, ela é um dos dados da situação existencial social que estamos vivendo, tem uma função dentro do universo das ciências, da tecnologia, etc., se faz mister ser analisada como força social, e não apenas  dentro dos detalhes formais da própria lógica.
O uso universal dos símbolos produz um sistema simbólico que é a definição de linguagem. Então, a linguagem é o sistema que permite a troca entre objetos da realidade física, as coisas, com objetos da realidade mental, os símbolos. A linguagem possui duas funções básicas. A primeira e principal função é a de intercâmbio social. O humano se comunica antes de aprender a falar. Sinaliza, gesticula, usa todo tipo de recurso para indicar seu estado emocional e o seu estado físico. Sabemos, por projeção das nossas próprias necessidades, quando um bebê sente fome ou dor, mas não sabemos exatamente o que ele sente. Quando um bebê chora, as mães precisam ser criativas e tentar todo tipo de solução para parar o choro da criança, pois não sabem exatamente se a criança está com fome ou se sente dor ou, ainda, se chora por manha. A segunda função da linguagem é o pensamento generalizante. Neste momento, o humano aprendeu a fazer abstrações, falando das coisas inexistentes (Saci Pererê, Cavalo Alado, Sereia, Mula Sem Cabeça, etc.) fazendo referências a elas. A ordenação do real, o agrupamento de ocorrências, a classificação e a previsão são parte dessa segunda função da linguagem. Então, o humano, aos poucos, ganha a habilidade de ser racional tão cara à nossa felicidade. É quando o humano se torna plenamente humano, dominando os processos mentais superiores, tipicamente humanos: ações conscientemente controladas, atenção voluntária, memorização ativa, pensamento abstrato, comportamento intencional.
BIBLIOGRAFIA
 
Frege, G. Alcoforado, Paulo (Tradução). Lógica e Filosofia da Linguagem. 2ª edição. São Paulo: Edusp, 2009.
Haching, Ian. Por que a linguagem Interessa à Filosofia?. São Paulo, (Unesp) 1999.
Lycan, William. Filosofia da Linguagem (tradução providenciada pelo Professor Dr. Giovanni Queiroz). João Pessoa, 2011.
Vygotsky, L.S. Pensamento e Linguagem. São Paulo, Martins Fontes, 1987.
Zilhão, Antônio. Linguagem da Filosofia e Filosofia da Linguagem. Estudo sobre Wittgenstein, Lisboa, Colibri, 1993

 

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